segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Historiador "fera" na réplica de dinossauros

Olá,
saiu na Folha de SP essa matéria e achei legal compartilhar, leiam:

Historiador "fabrica" dinossauros em São Paulo

Ateliê é o único do país a fazer réplicas de fósseis para museus e universidades. Trabalho foi motivado por frustração de filho de três anos do modelista com falta de esqueletos em exibição e já resultou em 42 réplicas
Um galpão em uma chácara em Itapecerica da Serra (região metropolitana de São Paulo) esconde um ateliê único no Brasil: uma fantástica fábrica de dinossauros. Carlos Scarpinni, 47, mais conhecido como Cao, tem formação de historiador, mas tornou-se na prática um especialista na anatomia desses grandes animais extintos. Suas réplicas de esqueletos de dinos podem ser encontradas nos principais museus e centros de pesquisa do país. Cao começou como nautimodelista. Fazia -e ainda faz- réplicas detalhadas de navios. O hobby virou profissão. Passou a fazer mapas topográficos e "maquetes de precisão" para engenharia. Seus barcos simulavam em miniatura aquilo que os pesquisadores gostariam de testar, por exemplo replicando as soldas ou os rebites que a embarcação real teria. Entre seus clientes estão desde a Escola Politécnica da USP e o Porto de Santos até a Rede Globo -ele fez modelos de navios históricos, como a nau Príncipe Regente, que trouxe Dom João 6º ao Brasil, e foi filmada para a minissérie "O Quinto dos Infernos", de 2002.
Hoje, graças ao sucesso dos seus dinossauros, construir navios voltou a ser hobby. A ideia de fabricar dinossauros surgiu em 2000, graças a uma exposição no Instituto de Geociências da USP sobre fósseis. Cao levou à exposição seu filho Oscar, então com três anos e já um fã de dinos. "Meu filho ficou frustrado", diz. Não havia réplicas de dinossauros, só pedaços de fósseis. Cao levou a ideia de produzir uma réplica à direção do instituto, que indicou o paleontólogo Thomas Fairchild para trabalhar no projeto. A verba foi obtida junto à Fundação Vitae. O animal escolhido foi um alossauro, um grande carnívoro que habitou o hemisfério Norte no Período Jurássico. "Foi o primeiro dino a ser reconstruído no Brasil em tamanho natural", diz Cao. Com 12,7 metros de comprimento, o esqueleto de alossauro enfeita hoje o pátio interno do instituto. Do papel à resinaO processo é trabalhoso. O primeiro passo é obter os trabalhos científicos descrevendo o animal. O ideal seria poder manusear também algum fóssil. Uma primeira réplica é feita em espuma ou isopor. O cliente -um pesquisador- examina o resultado para checar a precisão da reprodução. Depois de aprovada a réplica, é feita a cópia definitiva em resina. A cor e a textura reproduzem as originais do fóssil (o que explica ele ter feito um exótico dinossauro cor-de-rosa: a composição química do terreno fez o osso mineralizado apresentar essa cor). O material da réplica pode variar, dependendo do destino do esqueleto, pois uma exposição em área externa demanda uma resina mais resistente (e bem mais cara). Até agora Cao já construiu 42 réplicas de dinos e outros animais pré-históricos. Seus clientes incluem o Ministério da Ciência e Tecnologia, a USP, a Universidade Federal do Rio de Janeiro, o Museu de História Natural de Taubaté e o Museu dos Dinossauros de Uberaba. A lista inclui até um cliente privado. E deverá aumentar. Cao estudou 214 osteometrias -medições de ossos- desses vertebrados extintos. Tem hoje o potencial de fabricar 200 espécies diferentes. Dá para preencher qualquer museu. Casal planeja exposição com dinos nacionaisEm torno de 70% das réplicas de dinossauros feitas por Cao são de animais brasileiros. Se estivessem reunidas, já seriam suficientes para uma grande e inédita exposição. Ele e a mulher, Ana Maria Magalhães, especialista em marketing, negociam patrocínio para montar uma mostra desse tipo. "É frustrante você ver as grandes filas nos museus de história natural de Nova York, de Londres, de Berlim, e saber que não há nada desse nível no Brasil", diz Ana Maria. Ela lembra o impacto de visitar esses museus e ver em tamanho natural o esqueleto de um carnívoro intimidador como um tiranossauro, ou um gigante como o apatossauro. "Naquela exposição na Oca [Dinos na Oca] não tinha nenhum dino brasileiro, só crocodilianos e pterossauros", declara Cao. Como ele já tem experiência em produzir dinos que habitavam o Brasil, seria preciso apenas um ano para produzir as 20 réplicas de seres pré-históricos que o casal gostaria de ter na exposição. Em dado momento ele chegou a ter 14 dinossauros brasileiros prontos, mas que foram sendo vendidos. "Não dá pra ficar armazenando dinossauros", diz Cao. Uma amostra do que poderia conter essa exposição foi revelada no Rio de Janeiro em setembro passado: uma réplica do maior dinossauro brasileiro, o Uberabatitan riberoi, um herbívoro achado em Minas e descrito pelo paleontólogo Luiz Carlos Borges Ribeiro. Cao fez a réplica, que tem 12 metros de altura, exposta na Casa da Ciência da UFRJ. O Brasil tinha uma boa variedade de dinos. Herbívoros gigantes como os titanossauros estão entre os mais conhecidos, mas havia também grandes carnívoros, como o abelissauro, com cinco metros de altura, "primo" do tiranossauro e do alossauro. Daria para fazer um filme como "Jurassic Park" só com dinos daqui. No papel dos velocirraptores poderia ser escalado um primo brasileiro, chamado deinonicossauro. Chácara de artista preserva espécies de plantas da época dos grandes répteisPerfeccionista, detalhista, meticuloso. Ou, também, maníaco e idiossincrático. Todos esses adjetivos descrevem bem a atitude do fabricante de dinossauros Carlos Scarpinni, o Cao. Quando não está contente com um trabalho, ele literalmente destrói a réplica. Pica-a em pedacinhos. "Se um canal neural não está perfeitamente alinhado, vira lixo", diz ele (trata-se do orifício no meio das vértebras onde passa a medula). "Detesto remendar", acrescenta. A réplica inteira é destruída e vai para o lixo -o que deve certamente deixar intrigados os lixeiros. Ele afirma que é mais difícil reproduzir um pequeno dinossauro do que um de grandes dimensões. Alguns ossos são pequenos e delicados, e precisam ser recriados com fidelidade, para a réplica ter valor científico. Um exemplo é o curiosamente batizado sacissauro, um dos mais antigos do mundo, com seus 220 milhões de anos. Desenterrado no Rio Grande do Sul, o animalzinho de mero 1,5 metro de comprimento ganhou o nome porque só foram achados fêmures da perna direita e nenhum da esquerda. Entre as idiossincrasias do artista está ainda a criação de uma "mata triássica" em um canto florestado da chácara. Cao preserva ali apenas as árvores e plantas existentes no período geológico Triássico (entre 251 milhões a 199 milhões de anos atrás). Em seu escritório há dezenas de livros e periódicos científicos sobre dinossauros que dariam inveja a uma biblioteca universitária. Também há livros de referência sobre navios -e caixas de modelos de barcos aguardando um momento de lazer. Na estante convivem uma réplica -feita por ele- de um crânio do hominídeo Ardipithecus. E, bem ao lado, um modelo do foguete Saturno-5, que levou o homem à Lua. O perfeccionismo se nota no próprio ateliê. A ordem impera. Não há nenhuma ferramenta fora do seu nicho, nenhum material jogado ao acaso. A limpeza é hospitalar. O ambiente bucólico da chácara permite trabalhar sossegadamente. Em compensação, há problemas inesperados em trabalhar em uma chácara. Volta e meia ele precisa deixar uma peça secando ao sol. Os vários cachorros da casa em geral se comportam bem. Já o cavalo chamado Pacato tem surtos cleptomaníacos e às vezes rouba a peça secando e a esconde em algum ponto da chácara. "Não existiam as técnicas no Brasil para fazer essas réplicas", diz Cao. As universidades interessadas tinham de importar peças caras -e com o agravante que não existiam esqueletos de dinos tipicamente brasileiros. A fantástica fábrica de dinossauros de Carlos Scarpinni agora supre a demanda. (Folha de SP, 3/1)

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